Desde que eu ingressei no curso de Letras, há mais de uma década, ouvi falar de alguns petardos que representavam o mais elevado conhecimento que poderíamos adquirir durante a graduação. Nossos posteriores mestrados ou doutorados nada seriam frente ao que esses baluartes já haviam escrito.
Pois é, fui amalgamando decepção atrás de decepção à medida que lia algumas dessas publicações tidas como pedras fundamentais da minha área de formação, nada a ver com orientação política; mais era pelo conteúdo minguado das reflexões.
Depois de algum tempo, assim que o Brasil começou uma guinada abrupta ao conservadorismo, vivi para testemunhas alguns fenômenos curiosos nas redes sociais, pepetrados justamente por esses cidadãos, os baluartes das Letras brasileiras.
Uma ironiazinha tímida aqui, uma chargezinha ácida ali, e alguns textos mais repletos de críticas começaram a surgir. Eis que vejo, há uns quatro ou cinco dias, dois desses pilares da ética política das redes sociais (num oportunismo barato para criticar a indicação ministerial de um desafeto político) empregando o famoso “ridendo castigat mores” (rindo, castigam-se os costumes – numa livre tradução). Explico a situação: faziam troça do “avistamento” (a cena de Jesus na goiabeira, relatada por Damares). De modo educado, tentei explicar a todos que fizeram a piada que a situação motivadora da visão metafísica foi um caso de abuso infantil. Nada feito! Esses mesmos “gênios” da análise do discurso, da linguística textual, dos estudos de gênero, do preconceito linguístico etc. continuaram em suas posições, advogando que – independentemente do abuso – vangloriar-se de ter avistado Jesus era charlatanice barata para ludibriar aqueles que têm fé.
AVISO AQUI: EU NÃO CONCORDO COM 90% DAQUILO QUE O PRESIDENTE ELEITO DIZ, SEQUER SEI QUEM É A TAL DAMARES! DIGO ISSO ANTES DE VOCÊ DIGITAR “FASCISTA” LOGO ABAIXO DO TEXTO, NUMA REDUÇÃO ABSURDA.
Vamos aos fatos:
1 – Se Damares viu Jesus em uma goiabeira ou batendo um “flip” na rampa de skate, não faz a menor diferença. Experiências metafísticas são fenomênicas (individuais e singularmente particulares); isto é ELAS NÃO DEPENDEM DA SUA CRENÇA OU DA CRENÇA DO PROFESSOR DE QUALQUER PORCARIA QUE PENSE QUE ISSO É CHARLATANICE. Pode ser uma alucinação da grossa, é claro! Mas isso não dá o direito a quem quer que seja de fazer piada com tal situação! A sua crença não pode ser interveniente na crença / descrença do outro e vice-versa.
2 – O mais grave não é o “avistamento”, mas o motivo que gerou tal fato (?): a pessoa em questão sofreu abusos durante 4 anos. Ora, não é exatamente o que estamos a combater – os abusos, os desmandos, as desigualdades. Será que esses estandartes teóricos não leram, em seus manuais fantásticos, o significado do termo ALTERIDADE? Lembro-me de que – à epoca de Dilma – quando havia algum tipo de piada, havia verdadeiras palestras nas redes sociais sobre o quão errado é escarnecer uma figura feminina.
3 – Então, o problema está em Damares? Ou estaria no fato de ela ser evangélica? Ou no fato de ter sido apontada por Bolsonaro? Será que não há um grave problema de desonestidade intelectual nesses indivíduos que não suportam ver uma trasformação social (ainda que longe da ideal), que contrarie suas convições? Será que estamos a assistir um frenético show de birra dos teóricos que estavam acostumados ao mimo de uma audiência pouco questionadora?
4 – Ah, mas veja que estão dizendo que a ONG da Damares é acusada de… CALMA LÁ! Se ela cometeu algum crime, é mais certo que pague por tal! Ainda assim, NADA dá a você o direito de escarnecer a fé alheia e a abuso que tal pessoa sofreu. NADA!
5 – Mas ela usa isso para ludibriar aqueles que são inocentes e acreditam no que ela fala. Pois é, o mundo é assim! Dentro da universidade, conheço diversos teóricos que usam o próprio título para fazer militância política em vez de fomentar pesquisas e fazer o conhecimento sobre diversas áres crescer.
Enxergamos o tamanho da nossa crise moral quando percebemos que muitos dos ditos “iniciados” não conseguem ter o mínimo de decência ou respeito, ainda que clamem por justiça, elevando-se como os bastiões da ética e da honestidade.
A palavra é curta e simples, mas muito cara aos dias de hoje: #respeito